Tempos como os que vivemos atualmente são difíceis para quem tem posições firmes, seja em qualquer campo, religioso, político, clubístico, sexual. Nos últimos anos aconteceram diversos casos de injúrias, perseguições e infelizmente, na maioria das vezes, violência contra as chamadas "minorias". Mas se formos pensar bem, justamente esses tempos que parecem difíceis, possibilitam o crescimento do respeito e da tolerância.
Hoje, 21 de janeiro, oficialmente foi instituído como o dia do respeito à diversidade religiosa no Brasil. Serve muito mais para que possamos ampliar o debate sobre essa necessidade, algo que já vem sendo feito pelas agremiações carnavalescas desde os primórdios dos desfiles. A ligação do samba com as populações afrodescendentes é marcante na maioria dos casos, o que trouxe para as letras e enredos a temática religiosa tradicional dos antigos escravos, tais como o candomblé, umbanda, etc.
O Brasil é uma pátria miscigenada e de quebra, tornou-se um caldeirão de raças e culturas, sendo por conseguinte uma mistura de religiosidades. Essa mistura revelou-se nas avenidas do país em diversos enredos.
Em 2006 o Império Serrano apresentou o enredo "Império do Divino", mostrando justamente nossa tradição religiosa:
"Cantando em forma de oração
Serrinha pede paz, felicidade
Pra nossa gente que não pára de rezar
E como tem religiosidade
Senhor, olhai por nós
Até por quem perdeu a fé"
Serrinha pede paz, felicidade
Pra nossa gente que não pára de rezar
E como tem religiosidade
Senhor, olhai por nós
Até por quem perdeu a fé"
A poesia presente nos versos dos sambas traduzem com tamanha habilidade as realidades, sobretudo brasileiras com espanto. É o que podemos perceber nos versos agora de uma imperatriz, a Leopoldinense em 2010, no enredo "Brasil de todos os deuses":
"Viu nascer a devoção em cada amanhecer
Viu brilhar a imensidão de cada olhar
Num país da cor da miscigenação
De tanto Deus, tanta religião
Pro povo, feliz, cultuar
O índio dançou, em adoração
O branco rezou na cruz do cristão
O negro louvou os seus orixás
A luz de Deus é a chama da paz...
Oh, deus pai! Iluminai o novo dia
Guiai ao divino destino
Seus peregrinos em harmonia
A fé enche a vida de esperança
Na infinita aliança
Traz confiança ao caminhar
E a gente romeira, valente e festeira
Segue a acreditar...
A imperatriz é um mar de fiéis
No altar do samba, em oração
É o Brasil de todos os deuses!
De paz, amor e união"
A emoção do desfile traduziu muito da emoção da fé, expressa nesse samba, em forma de oração. E essas paradinhas foram de enlouquecer e rezar ajoelhado agradecendo por essa beleza toda:
Entre dezenas de enredos falando sobre a religiosidade e a fé, escolhemos um enredo vivo na memória, da super campeã do carnaval de São Paulo no carnaval 2014, Mocidade Alegre. Neste ano trouxe para a avenida o enredo "Andar com fé eu vou... que a fé não costuma falhar!"
A letra fez com que o desfile se tornasse uma verdadeira procissão:
"Oh pai, conduz teus fiéis a buscar
Na eternidade encontrar, a salvação
Religiosamente acreditar
Não importa a luz que te faz caminhar
Tenha fé que a fé não costuma falhar
Arruda pra benzer, ervas pra curar
Tem reza forte da Maria benzedeira
Firma o batuque no meio desse terreiro
Na crença do mandingueiro
Figa de guiné, patuá
Segue, o cortejo pelas ruas da cidade
Falsas promessas, mercadores de ilusão
Mas tem videntes, cartomantes, ciganas
Destino na palma da mão
No amanhã, o futuro virá
Eu boto fé, tudo vai melhorar
Basta querer, acreditar, tá dentro de você"
E como o blog fala de história, um enredo que conta historicamente a mistura religiosa brasileira foi o da Mocidade, agora do Rio de Janeiro em 1995 com "Padre Miguel, Olhai por nós!":
"Bravos navegantes portugueses
Encontraram o eldorado tropical, nosso chão
Rezaram a primeira missa,
abrindo as portas pra religião
mas o dono da terra, Indio Tupi
se admirou, sem nada entender
confundiram o seu credo natural
suas lendas e seu jeito de viver
Vieram os negros africanos
com seus tambores, orixás
e suas manifestações
Quantos imigrantes te abraçaram, mãe gentil
trazendo novas crenças pro Brasil
Aí, no meu país em louvação
sagrou-se a mistificação
com tantas preces e a miscigenação
Com a bandeira do Divino
com o reisado me encantei
na Lavagem do Bonfim,
na Cavalhada delirei
Padre Cícero e os romeiros,
quanta emoção
a fé se espalhando no sertão
é maravilhosa, é fascinante, é sedução
a mídia anunciando
e provocando tentação
o paraíso do futuro é aqui
com a nova era que virá
e hoje a Mocidade,
devota de paixão
te canta assim,
em forma de oração
Padre Miguel, Padre Miguel
Olhai por nós, olhai por nós
Se liga nessa gente tão sofrida, meu senhor
Tá sempre aguardando a sua voz"
Como de costume, um trechinho do desfile de 1995.
Para retomar o tema da diversidade, nada melhor do que mais um enredo, do Império Serrano 2007 sob o título "Ser diferente é normal". No desfile falava-se de expoentes das artes, música, cultura que eram taxados de diferentes e ou pessoas com necessidades especiais, vistas de forma "anormal" por parte da população.
Podemos fazer essa mesma associação com as religiões. É um pensamento simples, porém muito complicado de ser entendido pela população, ou seja: "SER DIFERENTE É NORMAL" e dentro disso, ter religião, fé, crenças, sentimentos diferentes é o que faz da vida essa grande e bela viagem, e sobretudo o que faz de nosso país um ícone mundial quando se fala em tolerância e respeito, já que aqui, como em nenhum outro lugar do mundo, existe uma diversidade ímpar.
Somos o país do futuro, um exemplo de união e respeito, só dependendo de nós tornar esse futuro realidade.
"Eu quero ver
O amor florescer
Ser diferente é normal
E o império taí
Pra levantar seu astral
Se liga no meu carnaval
Serrinha vem pedir respeito ô ô ô
Temos que olhar com outro jeito
Quem nasceu diferente
E venceu preconceito
A gente tem que admirar
Harmonizar pra ser feliz
Diferença social, pra quê?
Tá na cara que a beleza
Está nos olhos de quem vê"
E para fechar, uma prece, em forma de samba, do Império Serrano, para o próximo carnaval, no enredo "Poema aos peregrinos da fé”:
"POR TODOS OS CANTOS, COM TODOS OS SANTOS
VALEI-ME PADIM CIÇO, OXALÁ NOSSA SENHORA
TÁ NA HORA, ADORANDO MINHA ESCOLA
PEÇO A DEUS PRA ABENÇOAR
HOJE A FANTASIA É O MANTO
NOSSA SINFONIA UM ENCANTO
MEU SAMBA NUNCA VAI MORRER
E A SERRINHA VEM DIZER..
O BRANCO É A PAZ E O VERDE É ESPERANÇA
DE VER O MUNDO SÓ FAZER O BEM
SENHOR ROGAI POR NÓS AMÉM"
Enfim, é só ter RESPEITO!
Nenhum comentário:
Postar um comentário